domingo, 21 de dezembro de 2008

Pensamento - Arnaldo Antunes




Pensamento
Arnaldo Antunes

Pensamento que vem de fora
e pensa que vem de dentro,
pensamento que expectora
o que no meu peito penso.
Pensamento a mil por hora,
tormento a todo momento.
Por que é que eu penso agora
sem o meu consentimento?
Se tudo que comemora
tem o seu impedimento,
se tudo aquilo que chora
cresce com o seu fermento;
pensamento, dê o fora,
saia do meu pensamento.
Pensamento, vá embora,
desapareça no vento.
E não jogarei sementes
em cima do seu cimento.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Meu sobrenome é angústia
Meu passado me embrulha o estômago
Meu presente me dá um nó na garganta
Meu futuro me dá calafrios
Sensações da minha angústia
Como cada estação do ano ela muda
No verão é vermelha e intensa
No inverno é cinza como o céu
No outono se torna vazia, como as árvores que perdem suas folhas, é uma ausência de cor
Na primavera ela se revigora, assim como o desabrochar das flores
O tempo, as estações, e o sobrenome podem mudar mas não deixam de existir, fazem parte da vida
Assim como a minha incessante angústia

Autoria própria.

domingo, 14 de dezembro de 2008

O mundo das paixões é o mundo do desequilíbrio, é contra ele que devemos esticar o arame das nossas cercas, e com as farpas de tantas fiadas tecer um crivo estreito, e sobre este crivo emaranhar uma sebe viva, cerrada e pujante, que divida e proteja a luz calma e clara da nossa casa, que cubra e esconda dos nossos olhos as trevas que ardem do outro lado; e nenhum entre nós há de transgredir esta divisa, nenhum entre nós há de estender sobre ela sequer a vista, nenhum entre nós há de cair jamais na fervura desta caldeira insana, onde uma química frívola tenta dissolver e recriar o tempo; não se profana impunemente ao tempo a substância que só ele pode empregar nas transformações, não lança contra ele o desafio quem não receba de volta o golpe implacável do seu castigo; ai daquele que brinca com fogo: terá as mãos cheias de cinza; ai daquele que se deixa arrastar pelo calor de tanta chama: terá a insônia como estigma; ai daquele que deita as costas nas achas desta lenha escusa: há de purgar todos os dias; ai daquele que cair e nessa queda se largar: há de arder em carne viva; ai daquele que queima a garganta com tanto grito: será escutado por seus gemidos; ai daquele que se antecipa no processo das mudanças: terá as mãos cheias de sangue; ai daquele, mais lascivo, que tudo quer ver e sentir de um modo intenso: terá as mãos cheias de gesso, ou pó de osso, de um branco frio, ou quem sabe sepulcral, mas sempre a negação de tanta intensidade e tantas cores: acaba por nada ver, de tanto que quer ver; acaba por nada sentir, de tanto que quer sentir; acaba só por expiar, de tanto que quer viver; cuidem-se os apaixonados, afastando dos olhos a poeira ruiva que lhes turva a vista, arrancando dos ouvidos os escaravelhos que provocam turbilhões confusos, expurgando do humor das glândulas o visgo peçonhento e maldito; erguer uma cerca ou guardar simplesmente o corpo, são esses os artifícios que devemos usar para impedir que as trevas de um lado invadam e contaminem a luz do outro, afinal, que força tem o redemoinho que varre o chão e rodopia doidamente e ronda a casa feito fantasma, se não expomos nossos olhos à sua poeira? é através do recolhimento que escapamos ao perigo das paixões, mas ninguém no seu entendimento há de achar que devamos sempre cruzar os braços, pois em terras ociosas é que viceja a erva daninha: ninguém em nossa casa há de cruzar os braços quando existe a terra para lavrar, ninguém em nossa casa há de cruzar os braços quando existe a parede para erguer, ninguém ainda em nossa casa há de cruzar os braços quando existe o irmão para socorrer; caprichoso como uma criança, não se deve contudo retrair-se no trato do tempo, bastando que sejamos humildes e dóceis diante de sua vontade, abstendo-nos de agir quando ele exigir de nós a contemplação, e só agirmos quando ele exigir de nós a ação, que o tempo sabe ser bom, o tempo é largo, o tempo é grande, o tempo é generoso, o tempo é farto, é sempre abundante em suas entregas: amaina nossas aflições, dilui a tensão dos preocupados, suspende a dor aos torturados, traz a luz aos que vivem nas trevas, o ânimo aos indiferentes, o conforto aos que se lamentam, a alegria aos homens tristes, o consolo aos desamparados, o relaxamento aos que se contorcem, a serenidade aos inquietos, o repouso aos sem sossego, a paz aos intranqüilos, a umidade às almas secas; satisfaz os apetites moderados, sacia a sede aos sedentos, a fome aos famintos, dá a seiva aos que necessitam dela, é capaz ainda de distrair a todos com seus brinquedos; em tudo ele nos atende, mas as dores da nossa vontade só chegarão ao santo alívio seguindo esta lei inexorável: a obediência absoluta à soberania incontestável do tempo,

RADUAN NASSAR

LAVOURA ARCAICA

sábado, 29 de novembro de 2008


Ouça um bom conselho
Que eu lhe dou de graça
Inútil dormir que a dor não passa
Espere sentado
Ou você se cansa
Está provado, quem espera nunca alcança
Venha, meu amigo
Deixe esse regaço
Brinque com meu fogo
Venha se queimar
Faça como eu digo
Faça como eu faço
Aja duas vezes antes de pensar
Corro atrás do tempo
Vim de não sei onde
Devagar é que não se vai longe
Eu semeio o vento
Na minha cidade
Vou pra rua e bebo a tempestade
Bom Conselho
Composição: Chico Buarque

domingo, 2 de novembro de 2008

Trampolim

Sem olhar, sem respirar
Sem rir, sem pensar, sem falar
Só te provo um lugar
Qualquer piscina ou mar de Amaralina

O amor não é mais do que o ato
Da gente ficar
No ar antes de mergulhar
Antes de mergulhar

Dance, dance, cante, cante
Muito alto, sem medo de tudo
De nada, sem medo de errar

Vejo uma boca vermelhar galhar
A paixão não é mais do que o ato
Da gente ficar
No ar antes de mergulhar
Antes de mergulhar

Maria Betânhia

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

E agora, José?

A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José ?
e agora, você ?
você que é sem nome,
que zomba dos outros,
você que faz versos,
que ama protesta,
e agora, José ?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José ?

E agora, José ?
Sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio - e agora ?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora ?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse…
Mas você não morre,
você é duro, José !

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja a galope,
você marcha, José !
José, pra onde ?


Carlos Drummond de Andrade

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Como encarar a morte?


O Triunfo da Morte - Peter Brueghel

Uma pessoa que conhecia partiu, deixou seu corpo, mas a lembranças estarão em mim. E apesar da morte ser minha única certeza, por mais sabido, a ignoramos e ela vêm e novamente me passa uma rasteira.

Como encarar a morte.

Carlos Drummond de Andrade

De longe

Quatro bem-te-vis levam nos bicoso batel de ouro e lápis-lazúli, e pousando-o sobre uma acácia cantam o canto costumeiro. O barco lá fica banhado de brisa aveludada, açúcar, e os bem-te-vis, já esquecidos de perpassar, dormem no espaço.

À meia distância

Claridade infusa na sombra, treva implícita na claridade?Quem ousa dizer o que viu, se não viu a não ser em sonho?Mas insones tornamos a vê-lo e um vago arrepio vara a mais íntima pele do homem. A superfície jaz tranquila.

De lado

Sente-se já, não a figura, passos na areia, pés incertos, avançando e deixando verum certo cógifo de sandálias. Salvo rosto ou contorno explícito, como saber que nos procura o viajante sem identidade?Algum ponto em nós se recusa.

De dentro

Agora não se esconde mais. Apresenta-se, corpo inteiro, se merece nome de corpo o gás de um estado indefinível. Seu interior mostra-se aberto. Promete riquezas, prêmios,mas eis que falta curiosidade, e todo ferrão de desejo.

Sem vista

Singular, sentir não sentindo ou sentimento inexpresso de si mesmo, em vaso coberto de resina e lótus e sons. Nem viajar nem estar quedo em lugar algum do mundo, só o não saber que afinal se sabe e, mais sabido, mais se ignora.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

O mundo das crises: uma análise miscelânea Camilana

Recentemente li uma pesquisa no DATA-FOLHA traçando o perfil da juventude hoje. Um artigo em especial, de um psicanalista chamado Contardo Calligaris, me chamou a atenção: A adolescência acabou? Sem nostalgias baratas, conservadoras e burras, não é esta intenção deste texto.
Nasci em 1984, e penso que se eu pudesse traçar uma marco na história do Brasil escolheria este ano. 1984 foi o ano-marco para a redemocratização do país, ano que marca a transição da ditadura para a democracia, ano de luta (?), ano em que ocorreu as Diretas Já, ano do livro de George Orwell (rs), muito atual naquela época e hoje (quem não leu vale a pena, é um clássico).
Ano de luta? Pois bem. Nasci em meio a esse furduncio e todo rearranjo da organização do sistema político, social, econômico, cultural, etc. e tal do país. Uma nostalgia de luta e um sistema voltado para o conhecimento matemático me acompanharam durante toda minha estadia no sistema educacional. De um lado alguns professores de história relembrando as lutas e conquistas dos movimentos que pediam a democratização do país e dizendo que os jovens, no caso nós, éramos o futuro do Brasil (quanta responsabilidade, hein?). E de outro lado, cinco aulas de matemática por semana, além de física e química e apenas três de história e três de geografia que se dividia em geo-física e geo-política. Enfim, de acordo com essa estruturação do sistema educacional, pra mim, me parece claro que a educação básica não estava voltada para o aluno pensar e refletir sobre sua realidade.
Mas essa angústia em meu peito, de uma história de luta e conquistas dos movimentos sociais me fascinavam, talvez por isso tenha escolhido fazer o curso de ciências sociais. Lembro-me bem de um professor de química, que vez o outra encontro nos corredores da UFES, fazer um questionamento em sala de aula sobre porquê o mapa do mundo se posicionava daquela maneira se de acordo com o espaço não há referencial que indique que o norte é para cima e o sul para baixo. Aquilo ficou encafifado na minha cabeça por um bom tempo, tanto que comento aqui.
Mas como em tudo na vida existem porém’s. Tudo bem, ficamos sabendo que Betinho Souza, Henfil, Darcy Ribeiro, Zuzu Angel e os tropicalistas Chico Buarque, Caetano Veloso e Gilberto Gil, lutaram pelo direito da democracia e o direito de vender seus livros e discos e enterrar seus filhos. Mas a minha mãe e o meu pai não sabem de nada disso, assim como a mãe e pai de muitos amigos, e a minha avó nem sabe o que é ditadura.
Outro porém, acreditava-se que a democracia resolveria os problemas do Brasil, andava-se com um livro de Marx em baixo do braço e se diziam socialistas ou comunistas sem nunca terem lido uma página sequer do O Capital, e os que liam transformavam idéias grande em medíocres por serem pequenos, afinal era bonito ser socialista naquela época.
O mundo se mostrou mais complexo do que o direito de se vender livros e discos, ficou mais complexo entender em que realmente consiste a democracia, a realidade se mostrou mais complexa em relação as desigualdades sociais (afinal é só uma questão social? e o psicológico? e a história? e a política?)
De repente todos exigiam seu lugar ao sol, exigiam seus direitos, negos, brancos, pardos, indígenas, orientais, homossexuais, gays, lésbicas, transexuais, travestis, bi’s, hetros, os evangélicos, da quadrangular, universal, maranata, os candomblés, umbandistas, macumbeiros, cardecistas, católicos, ateus, os emos, punks, sertanejos, rockeiros, as putas e as carolas, os nordestinos, sulistas, e eu. E o direito de ser de direita, porque não? Um aluno me perguntou em sala de aula se uma pessoa não teria direito de ser racista desde que não fizesse mal a ninguém (essa doeu pra responder, afinal o menino tinha uma dose de razão).
Enfim, democracia hoje é um pouco isso, os religiosos se candidatando a cargos políticos em favor da moral e valores cristãos, os neo-nazistas se reunindo e defendendo a supremacia branca, pessoas defendendo a não legalização do aborto enquanto mulheres morrem ou fazem abortos de risco em clinicas fajutas ou com remédios em casa mesmo, ou se possuem dinheiro pagam absurdos. Democracia é um pouco ter direito de colocar silicone, botox, fazer plástica, ser loira ou morena. Mas e o coletivo, onde é que fica mesmo?
Enfim, mas e a juventude? Segundo o artigo de Calligaris, a rebeldia, que por tempos foi associada à juventude, não existe mais (ou talvez nunca tenha existido), o jovem hoje quer saber de trabalho, saúde e família, um emprego em que ele possa ter a próprio casa, sustentar sua família e todo ideal burguês, e um carro com som (aparentemente para poder ficar ouvindo música enquanto o mundo pára por conta do engarrafamento, [nota da autora]). Mas e o coletivo, onde fica mesmo?
Não, não tenho nostalgias, as gerações anteriores também cometeram suas falhas, e as de hoje pensam no próprio umbigo. E eu penso que o maior vitorioso nessa história é o capitalismo. Afinal ser rebelde hoje é andar de all star de 60 reais, camiseta de Che Guevara de 120 reais, óculos estilo Raul Seixas de 400 reais, e um carrinho velho de 16 mil, mas afinal, a liberdade não tem preço, use master card e parcele tudo em cinco vezes.
E eu aqui não posso nem desejar que os Estados Unidos da América se foda porque a gente acaba se ferrando junto. Ainda tenho que engolir que o mundo todo se mobilizando em favor de um país que promove guerras, mata seu próprio presidente e Martin Luter King, subjuga os pais mais fracos economicamente em favor da democracia capitalista para que todos possam ter o direito de comparar all star e comer um hambúrguer do Mac Donald, um merda de país que tem que ser engolido goela abaixo com um presidente terrorista que me provoca náusea.
Mas quer saber, uma parte de mim quer que o mundo entre em colapso mesmo, para que pelo menos possamos repensar toda a estrutura e forma de organização mundial. Vivemos e ainda louvamos instituições falidas como se fossem verdades absolutas ou única forma de conceber e organizar o mundo. Infelizmente a história já mostrou que só nos momentos de crise repensamos e refletimos nossos valores e instituições como família, escola, política. Meu único medo é que os evangélicos dominem o mundo.

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Abduzida

Já repararam como o consultório odontológico parece com aqueles filmes de ficção científica em que o extraterrestre rapta um terráqueo para abri-lo e examiná-lo. Foi mais ou menos assim que eu me senti naquela maca com aquele olinhos em cima de minha cabeça, aquelas mãos com luvas, máscaras, toucas, jalecos (tudo muito branco), fora aquelas brocas, pinças, sugador de saliva, tudo aquilo dentro da minha boca, que não é tão pequena, mas eu sou capaz de jurar que não cabia. E a moça com aquele suga-saliva, o que tinha de bonita tinha de desajeitada, quase me deixou desidratada, e por pouco não levou a minha língua com o dente, bochecha e tudo junto. Mas tenho que confessar, a vista lá de cima era linda!

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

PARA OUVIDOS ATENTOS (Com o perdão do clichê)


Já faz um tempo, mas como muitos ainda não conhecem o som destes paulistanos, decidi que vale a pena tocar no assunto. Em 2004, já com alguma fama no circuito musical alternativo devido a intensidade de seus shows mais do que pela musica em si (isso é normal - e desejável - em se tratando de rock'n roll), a banda Ludovic lançou o disco "Servil", seu perturbado disco de estréia. Hoje eles lançam o disco "Idioma Morto", já reconhecidos pelo Brasil para quem é atento à produção roqueira em terras tupiniquin e sabe que, para além de Charlie brown e Tijuana, temos coisas como Móveis Coloniais de Acajú, Diagonal, a renovada Nação Zumbi, Mallu Magalhães o projeto 3 na Massa e a banda em questão, Ludovic. O novo disco está a disposição no site Trama Virtual (http://www.tramavirtual.com.br/), mas o velho só correndo atrás. Eu corri. Não muito, em tempos de mp3. Mas o fato é que, para quem gosta de um som visceral, louco e por vezes diabólico, e que tenha um pouco de sado-masoquista no que diz respeito a letras ("comparado a mim, ele é um semi-deus", é tudo que diz a letra de "ombro a Ombro"), vai sentir o sangue jorrando dessas letras e sacar porque, em tempos de tantas sub-sub classificações na musica, o simples rótulo de Rock já explica muita coisa. Dançar loucamente, se vestir de uma melancolia eufórica típica de um maníaco-depressivo e vibrar sem ter na verdade o que comemorar, por que o disco é um uivo de derrrota (terceiro clichê: ouvidos atentos, som visceral, e essa agora, uivo de derrota. Repararam?). Como se Ian Curtis, depois de assistir "O idiota" de Herzog e ouvir Iggy Pop, ao invés de se enforcar, tivesse gravado um disco com alguma banda punk enlouquecida. E o resultado é isso. Gritos e sussurros da melhor qualidade. Vou deixar uma amostra de uma letra, e amanhã baixarei o disco novo. Tente. E aproveite.
P.S: Sim, este é o título da Musica.
Teoria e Prática na voz de um Veterano Ofegante
Quanto ao discurso que eu deixei por fazer
É só outra coisa que eu deixei por fazer
Eu assumo a culpa, eu assumo a culpa.
Foi a pior ofensa que eu já ouvi
Mas foi a melhor oferta que eu já recebi.
Eu assumo a culpa, eu assumo a culpa,
Eu assumo a culpa.
Mande lembranças por mim.
Guarde os restos pra mim.

domingo, 10 de agosto de 2008

Não Vale A Pena

Ficou difícilTudo aquilo, nada disso

Sobrou meu velho vício de sonharPular de precipício em precipício

Ossos do ofício

Pagar pra ver o invisível

E depois enxergar

Que é uma pena

Mas você não vale a pena

Não vale uma fisgada dessa dor

Não cabe como rima de um poema

De tão pequeno

Mas vai e vem e envenena

E me condena ao rancor

De repente, cai o nível

E eu me sinto uma imbecil

Repetindo, repetindo, repetindo

Como num disco riscado

O velho texto batido

Dos amantes mal-amados

Dos amores mal-vividos

E o terror de ser deixada

Cutucando, relembrando, reabrindo

A mesma velha ferida

E é pra não ter recaída

Que não me deixo esquecer

Que é uma pena

Mas você não vale a pena

Maria Rita

sábado, 26 de julho de 2008

Dura Lex, Sed Lex, na justiça só rolex

Eu não sou Roberto Dávila, mas também estou dentro do judiciário.

O poder judiciário parece um labirinto do Minotauro, o bestial lutador de Vale Tudo, e não a besta fera da mitologia grega.

O problema do judiciário é que ele tem muitas instâncias. Um juiz tem uma instância no Mato Grosso, um desembargador possui uma enorme instância em Goiás e um juiz federal também tem várias instâncias no Espírito Santo, onde cultiva o trabalho escravo.


Apesar de todos falarem latim, ninguém se entende no judiciário brasileiro.

Um juiz manda prender, aí vem um outro juiz, que tomou laxante, e manda soltar. No final da história, o juiz fica todo tocado. A justiça é cega e não vê o que acontece no judiciário brasileiro, mas sente o cheiro, o que é muito pior.

Mas nem tudo está perdido na justiça. Algumas pessoas insinuam, maldosamente, que a lei é dura, mas é mole comprar um juiz no Brasil. Isso não passa de uma mentira deslavada de um insulto, de uma calúnia, de uma falácia! Não é fácil comprar um juiz no Brasil. Tem que chegar cedo, entrar na fila e disputar a sentença com traficantes, Dantas, Pitta, Naji Nahas e .......

Data venérea, não posso reclamar da justiça brasileira. Sempre que precisei dos homens da lei pude contar com Costa Citty, Gilmar Mende, Marco Aurélio, Leopoldos... Contando junto com vários milhões de dólares. Outro dia mesmo, quando um ladrão de galinhas resolveu levar a Isaura, a minha patriota, na mão grande, a justiça se fez presente.

Depois de receber um presente, a justiça meteu o bandido na cadeia, onde cumpre a pena de prisão perpétua.

quinta-feira, 3 de julho de 2008

Invadindo Domicílios

Você pode me dizer tudo; Não tenha medo.
Eu não sou mau.
Não vou roubar seus filhos, sua casa ou seu dinheiro;
Me diga:
Como você tem gasto seu dinheiro?
Cigarros, mulheres, bebidas?
O governo não gosta disso (ou talvez só finja que não);
Mas não vamos te punir;
Você tem pagado o dízimo
Naquela igreja que você nem sabe se acredita?
É que eu preciso saber sua religião, idade, peso
E se você se acha preto ou branco;
Não se esqueça, você deve me contar tudo.
As contas pagas, não pagas, lícitas ou ilícitas,
Seu imposto de renda, o trabalho que te mata;
Eu vou entrar tão sutilmente na sua vida
E desaparecer tão súbito quanto surgi,
E ainda assim você deve confiar em mim.
Se você não me disser, isso é crime,
Mas eu não preciso te dizer isso, não é mesmo.
Somos do governo federal.
É tudo para seu próprio bem.
Não se preocupe, nós nos preocupamos por você.
Conte-me os seus segredos.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

O Drama de Herculine

Herculine Babin, um hermafrodita do século XIX que vive como menina num convento até um dia, aos 20 anos, confessa a padres e, posteriormente, a médicos que seus desejos e práticas eróticas se dirigem às meninas.

A partir desses momentos é obrigado a assumir legalmente o sexo masculino, a vestir-se como homem e a se afastar das meninas com quem vivia, inclusive sua amante. Butler afirma que Herculine sofre com a injunção de ter de pertencer a um dos dois sexos e deposita em seu corpo a causa do sofrimento.

Um corpo anômalo, razão de seus desejos e aflições, que provoca confusões de gênero e estimula prazeres transgressivos. Mas Butler discorda de Herculine. A causa do sofrimento não estaria no corpo, mas sim nas cobranças médicas, religiosas, jurídica e social de um gênero inteligível.

Herculine não poderia ser mulher ou homem “por inteiro” como idealizava seus interlocutores da época. Então, não lhe restava o que ser, pois lhe permitiam existir somente como desviante ou doente. Nas seqüências dos acontecimentos, Herculine se suicida.
Judith Butler.

sábado, 21 de junho de 2008

Ode – Um Corpo de Vinho


“É a noite, são as ondas deste mar e os roucos sussurros de Janis cantando Summertime”, me dizia ela, mas eu precisava lhe dizer que não, querida, é mais que isso que traz para nós esse poder mágico. Somos tão diferentes, entretanto somos cúmplices desta noite consagrada. Somos nós que trazemos para as ondas que quebram na areia fina desta praia este brilho sedutor, são nossas vozes combinadas que fazem essa melodia ser tão agradável, é o que compartilhamos que nos tornaram eternas na madrugada passada, não foi a música nem o frio que fizeram daquele carro o melhor lugar para se estar naquele instante. Não foi o doce prazer do paladar que nos satisfez, mas todas em volta da mesa, na maior das liberdades atingidas, a de nos desfrutar, uma da presença da outra, estávamos vivendo queridas, estávamos exercendo o milagre de existir. É a beleza de cada peculiaridade combinada com a condição que compartilhamos, e não tente, doce menina, medir qual de nós aguçamos mais essa condição, ser mulher nunca vai ser miscível, mesmo porque como disse a outra gota deste vinho, essa condição não possui parâmetro. Nós soubemos viver amores, somos o corpo de um fino vinho, nós nos vivemos nesta noite entorpecedora. Não vivemos o paladar nem a audição nem a visão, vivemos algo muito mais sublime, vivemos nesta noite nossa condição de mulher, compartilhada num êxtase que nunca mais viverão em outro lugar se não naquele tempo e espaço da noite passada.
Texto de Natali Braga





Baixe aqui “O Quereres” com Caetano Veloso: http://www.mediafire.com/?nznsjzenmdw

segunda-feira, 16 de junho de 2008

A Ética do Assalto

Tudo bem. Este título é totalmente sem lógica e sem sentido. Assalto é assalto, ética é ética. Mas não foi bem assim que Joana achou, pois havia lido a poucos dias uma definição sobre ética que dizia: conjunto de regras que orientam a conduta em uma atividade profissional.

Ao chegar ao ponto de ônibus, ansiosa em saber se o coletivo que contava já havia passado ou não, um rapaz se aproxima e diz:

- Fique quieta e passa o celular. Eu só quero seu celular!

Como muito bem havia aprendido com as recomendações de especialistas em segurança, ela não reagiu. Pegou prontamente o celular na bolsa e entregou ao rapaz e se dirigiu ao sinal para poder atravessar a rua e sair daquela situação desagradável. Entretanto o rapaz se aproximou um pouco mais enquanto ela caminhava e disse:

- Agora passa o dinheiro. Se gritar eu taco este celular na sua cabeça!

Joana não pensou duas vezes e resmungou que não. Como poderia o homem quebrar o acordo feito há segundos atrás, de só levar o celular? Joana não discutiu com o homem nem muito menos se mostrou provocativa. Apenas seguiu andando enquanto ele se aproximava de outras duas mulheres. Atravessou a rua e se dirigiu até sua casa. Escolheu dar as costas ao rapaz, e este resolveu não tacar o celular em canto algum, afinal, o objetivo inicial de sua missão era sair com um celular de lucro sem gritos e conflitos e não com um celular quebrado e uma cabeça ferida. Que bom para Joana que o objetivo do rapaz era este, afinal, o acordo só existia na cabeça dela!

PS: me desculpem a invasão da segunda, mas é pq eu precisava desabafar!!!rsrsrs

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Meu Segredo

Precisei tomar muitas doses de coragem para vir escrever isto. Ainda assim acredito que não tenha sido suficiente, então respirei fundo e escrevo isto de um fôlego só. Há um segredo meu que preciso compartilhar, e irei dizer agora. Contar um segredo não é algo tão simples, então corro o risco de parecer banal ou óbvio. Mas quem conseguir ver, e não apenas olhar, irá compreender. Porque tomei esta decisão? Ainda não sei ao certo. Pulsações traiçoeiras me trouxeram até aqui. Mas o que é este segredo então? Antes, devo dizer o que entendo como segredo: Algo que, mais do que não dito aos outros, dificilmente é reconhecido por si próprio. Não deve ser algo pernicioso ou cruel, aquilo que se teme contar pelas possíveis represálias, um fato que você esconde impelido pelo morcego da consciência; isto seria um pecado e não um segredo. Um segredo, para que seja um mistério, é algo que você não consegue exprimir e só agora entendi isto. É algo tão profundo e tão disforme que não existe senão na parte mais tenra do coração, e que quando você tenta dizer, ou pintar ou escrever, a boca seca, os pincéis falham e a mão paralisa; só sendo inexprimível isto pode ser um segredo, que também é mistério. Dele você não tem vergonha, ou medo, a não ser que seja a vergonha ou medo do desconhecido. Então, vou contar meu segredo, e que a chuva me proteja depois disso, e que vocês me perdoem por tê-lo guardado, e me entendam pois só por isso ele era um segredo. Foi agora que conheci alguém que me contou esse segredo sobre mim, é que existem no mundo feiticeiros que entram em nossos corações e daí nada permanece sem forma por muito tempo. Uma dessas mulheres me contou meu segredo, e agora conto a vocês, pois, agora que ela deu uma forma a isto, posso exprimi-lo, e assim não é mais segredo, mas continua mistério. E por não ser mais segredo, nem para mim, quero dividi-lo, e é assim: “Agora sei: Sou só. Eu e minha liberdade que não sei usar. Grande responsabilidade da solidão. Quem não é perdido não conhece a liberdade e não a ama. Quanto a mim, assumo minha solidão. Que às vezes se extasia como diante de fogos de artifício. Sou só e tenho que viver uma certa glória íntima que na solidão pode se tornar dor. E a dor, silêncio. Guardo o seu nome em segredo. Preciso de segredos para viver”.

Café Russo: sem rumo II

Eu avisei que este conto não teria fim! É que a vida continua, embora bandoleiro. E apesar desta roleta russa de amores e desamores meu coração cigano não se ressente. E mesmo que, ao me olhar no espelho eu veja gotículas salinas que deságuam por ninguém, não há sinal de amor por trás dessas lágrimas, não há alma neste corpo, apenas café para dar ânimo.

Resolvi arremessar tudo pro alto, apostar que o ser humano é capaz de voar! Preparei minha mala. Estou decidida, vou abandonar tudo, ficarei apenas com meu caráter. Não, não é uma solução, mas eu não estou em busca de uma. Acendi um cigarro e sentei-me naquela mesma mesa branca onde tudo começou naquela manhã cheia de possibilidades e que acabou por tornar-se eterno retorno. E minha cachorrinha Dudi continuava me espiando e vigiando cada passo meu com aqueles olhos albinos.

Nada de novo, nada mudou de lá pra cá. Ah sim! como poderia me esquecer! troquei o fogão de lugar com a mesa. Hábito terrível que adquiri com minha mãe, sempre mudando os móveis de lugar, os mesmos velhos e encanecidos móveis, mas que me renderam bastante ocupação nas noites de insônia, e bastante insônia ao vizinho.

Decidi largar a terapia de insônia à base de maracujá e camomila (depois de um tempo essas coisas não fazem mais efeito) e fui preparar um café na cafeteira italiana. Só o aroma daquela água fazendo amor com aquele pó marrom se entrecruzando e fundindo bastavam para me embriagar e me remetia a dias passados quando consegui este pó na casa de um velho amigo e em seu próprio quintal torramos e moemos os grãos do mais saboroso arábica. E aquela fumaça tão carregada de nostalgia me fazia fechar os olhos por alguns segundos, e por alguns segundos eu pude acreditar que tudo é possível.

Quando levantei as pálpebras pude ouvir minha cachorra falando “sua idiota”, sacudi o rosto “Calma Catharina, deve ser algum devaneio ocasionado pelas noites sem dormir sem dormir.” Mas as palavras de Dudi ainda ecoavam em meu estômago.

O café estava pronto, coloquei-o na xícara e como sempre derramei um pouco na toalha, decidi assassinar essa maldita consciência em meu estômago com um banho de café quente. O alívio foi imediato. Dei mais um trago no segundo cigarro cuja cinza se estendia por todo seu comprimento, e lembrei de também assassina-la no cinzeiro antes de provocar algum incêndio. Olhei para a janela e naquele estreito pedaço de céu espremido entre o concreto meus olhos procuravam voar e minha perna inquietava-se por debaixo da mesa.

Aquela espera me deixava angustiada. Não tinha certeza se deveria esperar Pedro chegar para avisá-lo que eu estava de partida, ou se simplesmente deveria deixar um bilhete, ou talvez desaparecer sem deixar notícias. E apesar dos extremos de minha vida, desta vez optei pelo meio termo e escrevi um bilhete. “Pedro, vou embora meu bem, o mundo é muito maior que estas paredes que nos cercam. A janta está no forno. Beijos. Catharina.”

Dei meu último trago no cigarro e o apaguei no cinzeiro que eu e Pedro compramos no dia em que resolvemos que moraríamos juntos em sua casa. Ele tinha o péssimo hábito de não fumar e não queria que eu comprasse o cinzeiro, ainda mais naquele preço, talvez porque em algum devaneio em queria acreditar que eu pararia, mas por fim eu o convenci de me dar aquele cinzeiro de presente, ele sempre soube que eu o manipulava, mas fazia pouco caso em me contradizer. Dei meu último trago naquela xícara de café, aquela xícara estúpida que já se encontrava ali antes mesmo de eu chegar, eu não teria o péssimo gosto de comprá-la.

Levantei impulsionada pela cafeína. Minha consciência ainda me olhava com aquele focinho albino. Peguei a mala e ao fechar a porta dei de cara com Pedro. Estou indo embora Pedro, e é para sempre. Mas pra onde você vai? Para fora da possibilidade. Como assim? Reencontrei um antigo namorado, Paulo Roberto, e nós vamos fugir. Para onde? Se eu dissesse não seria uma fuga, mas agora vamos, deixe de novelas mexicanas. Adeus.

quarta-feira, 4 de junho de 2008

Liberalização X Restrição. Qual é a verdadeira questão?

O debate entre segurança pública, tráfico e usuário de droga vem tomando espaço nas posições da imprensa. De um lado, existe um público que é a favor da manutenção de leis que proíbem o consumo e o outro público que defende a legalização do uso.

Após a desclassificação da seleção do Botafogo, fui sacear minhas amarguras lendo a matéria publicada sobre o livro McMáfia. O crime sem fronteiras. De acordo com o livro, o crime organizado que engloba a produção e o consumo de tráfico de armas e drogas representação 20% da economia mundial segundo o FMI. Esses 20 % representa entre 17% a 25% do PIB mundial.

Isto me chamou a atenção para entender a escala mundial do tráfico de drogas, que tem como matriz desde o contrabando de armas do EUA para Colômbia, ao cultivo de maconha no Canadá até o centro de produção de Ectasy em Israel e o cultivo de heroína na Afeganistão.

O deixa fazer do clássico Iluminismo, significa que a produção ilegal é a principal atividade econômica de oligarquias legais que expandem o seu desenvolvimento no mercado financeiro. Fica claro entender que a criminologia sensacionalista tenta vende o round entre proibição X legalização, mas todos esses cenários fixam suas análises sobre a esfera micro do efeito social, nunca foi sobre a lógica do usuário ou do traficante local que se fomentou a endemia do crime.

As livres circulações de capitais sempre foram regulamentadas por órgão institucionais como OMS, Banco Mundial, ONU e outros, que autorizam e reconhecem a existência de famosos oligopólios como Tríade, Yakuza, Mercedes Bens e vários outros.

Em suma, o caminho da segurança pública é pautado pelo combate sem tréguas às drogas, mas com total permissividade a toda atividade empresarial e financeira. É sobre o Estado que se esteia a bandeira de combate ao tráfico, porém, é este mesmo Estado que regulamenta a liberalização econômica das atividades do crime.

Vejo que o maior obstáculo para a segurança pública não a questão da venda legalizada de drogas, pois o aumento de dependente químico precisa ser compreendido com uma questão de saúde pública também. O maior obstáculo que considero talvez esteja na capacidade de regular um mercado que é Liberal. Que legaliza o enriquecimento de grupos que extrai seu afortunamento através de atividade subumanas como a exploração sexual, como o tráfico de órgão, como o extermínio sumário ao dependente químico.

Encerro esta idéia com a seguinte constatação. O capitalismo do crime continuará triunfando sobre nós. E o resultado disto é demonstrado nas fotos das pessoas assassinadas a cada dia. O Laissez Faire que triunfou com escravagismo, agora reinscreve a casa grande e a senzala na contemporaneidade.

domingo, 25 de maio de 2008

HOMENAGEM A PAGU

Patrícia Rehder Galvão (1910-1962), mais conhecida como Pagu: Jornalista, escritora e militante comunista e principalmente uma mulher desafiadora. Foi presa, torturada, foi amante,fumava na rua, usava roupas transparentes,tornou-se musa do movimento antropofágico de cunho modernista, causou-se e deixou filho e marido (Oswald de Andrade), viajou pelo mundo. Escandalizou, desafiou e resistiu aos padrões impostos pela sociedade. Na véspera de sua morte (causada por câncer) seu último texto é publicado: o poema Nothing.
Poema de Pagu
NOTHING
Nada nada nada
Nada mais do que nada
Porque vocês querem que exista apenas o nada
Pois existe o só nada
Um pára-brisa partido uma perna quebrada
O nada
Fisionomias massacradas
Tipóias em meus amigos
Portas arrombadas
Abertas para o nada
Um choro de criança
Uma lágrima de mulher à-toa
Que quer dizer nada
Um quarto meio escuro
Com um abajur quebrado
Meninas que dançavam
Que conversavam
Nada
Um copo de conhaque
Um teatro
Um precipício
Talvez o precipício queira dizer nada
Uma carteirinha de travel's check
Uma partida for two nada
Trouxeram-me camélias brancas e vermelhas
Uma linda criança sorriu-me quando eu a abraçava
Um cão rosnava na minha estrada
Um papagaio falava coisas tão engraçadas
Pastorinhas entraram em meu caminho
Num samba morenamente cadenciado
Abri o meu abraço aos amigos de sempre
Poetas compareceram
Alguns escritores
Gente de teatro
Birutas no aeroporto
E nada

sábado, 24 de maio de 2008

Dia Nacional do Café!


Como deixar passar em branco o aniversário do principal homenageado deste blog?
Manhã e café, tudo a ver. Papo e café, nem se fala. Os fumantes dizem que com um cigarrinho não há nada melhor.
O Brasil é o maior produtor e exportador do grão e, em consumo, perde só para os Estados Unidos.
Esta bebida que excita o sistema nervoso, ativa o cérebro e a circulação do sangue, tonifica o coração e os músculos, combate derrame cerebral, asma, diarréia, embriaguez e depressão é cada vez mais consumida no país.
Vício bom este, não??? Aprecie sem culpa e sem moderação!

sexta-feira, 23 de maio de 2008

Le Café Français

O café nunca foi francês nem brasileiro, o café é das cabras. Acharam, comeram e foram dançar há alguns séculos atrás na frente de um pastor da Etiópia:
Revelaram para gente o produto. Os árabes chamaram de Kawa e em Alexandria lá no século X lançaram um tipo de estabelecimento batizado do mesmo nome: café. O produto era bom, além de fazer dançar as cabras, ele fazia pensar os homens e os homens que pensam fazem evolução. O café traz na história dele encontros e palavras; estas palavras que querem mudar o mundo; essas palavras interditadas por aqueles que pensam no lugar dos outros, aqueles que pensam que a gente não pensa.

(Jean-Pierre Giacardi)

Foto por Syã Fonseca

Le café Français funciona toda sexta e sábado no Estaleiro do Inó

Praia das Castanheiras, Jesus de Nazareth, Vitória.

ao lado do bar do Bigode

tel: 3224-3890

http://lecafefrancais.blog.terra.com.br/

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Por trás de um grande jogador existe sempre um grande travesti.

O escândalo do Ronaldo fenômeno com três travestis no motel Papellon continua na boca e em outros orifícios do povo. Debates acalorados, discussões suadas, mesas redondas, polêmicas...Em toda parte só se fala nisso, quer dizer só se fala nisso.

Afinal: o que se passou no quarto de motel com o famoso atracante rompedor Ronaldinho fenômeno? Alguns estudiosos atribuem ao Funk carioca o comportamento transgressor do craque, ou será que foi cocaína.

Alguns economistas acham que o problema é de natureza macroeconômica, que dizer microeconômica. Mas todo mundo quer saber é ser Ronaldinho foi ao motel comprar lã ou saiu tosquiado. No mundo machista e vil (desculpe, viril) dos vestuários de futebol o que se cochicha pelos cantos é que o célebre jogador de futebol trocou de posição, e agora joga recuado.

Mas, não se preocupe meu caro nobre goleador chanceler da Unesco, por trás de você sempre haverá uma grande, gigante Globo transvestida de Patrícia Punheta (desculpe novamente, Poeta) para acalentar seus eretos delírios da psique.

Os psi-cánalista preferem ver esta questão por um outro ângulo. Para os freudianos isto se trata de um complexo fundo nervoso. Bastante nervoso inclusive! Afinal foram quatro horas de terapia intensiva no quarto do motel, mas o diagnóstico preliminar comprovou seu estado deprimido, cheio de lesões e nesta turbulência errou a preferência.

Mas eu sou hetero!!!! Disso o atacante, cai numa cilada! Era uma quadrilha de travestis que queria extorqui meu dinheiro ganhado a duras penas!

Enfim, tentar tornar lúdico este fato talvez alivie um pouco as minhas angústias. Como disse Érika Kokay, essa é a parte que nos cabe neste latifúndio. Para mim, Leyse, se esta é a parte que me foi concedida, digo que é muito pouco. Não quero apenas o interior da minha casa, quero as Ruas, os Direitos, o Respeito.

Quero o reconhecimento digno do meu amor por uma mulher,

Como diz Clarice, Liberdade para mim é pouco.
O que quero ainda não tem nome.

domingo, 18 de maio de 2008

Olhares desnudos

Olhares que me encaravam de frente e que me tornavam desnuda

Olhares insuportáveis que expressavam a vontade de ser o outro

Acendo um cigarro, tomo um gole de cerveja e tento na distração do meu ser esquecer tais olhares.

Porque me importunam, o que querem de mim?

Eu que só quero deixar os meus pensamentos vagarem em meio aquela paisagem incessante com o céu estrelado, a água corrente, a lua, o balanço das folhagens.

Nesse mundo com tantas coisas a serem observadas porque o observado sou eu . Eu que só quero no meu canto admirar o encanto dos seres ao meu redor .

Encontro o desencanto do ser que deveria ser tão precioso quantos os outros.

O ser humano que na cegueira da inveja torna imperceptível pormenores daquele dia fugidio.

Os olhares que me desnudam me tornam mudo diante deste mundo.

Não tendo olhos bastantes a contemplarem, esses olhos se perdem na insensatez da mediocridade humana.

Autoria própria.

sábado, 17 de maio de 2008

Ordem e Progresso



Aos que têm o hábito de assistir TV sem se comover com sensacionalismos, certamente está farto de ouvir notícias sobre o “Caso Isabela”; aliás, sobre “O Caso Isabela”, afinal, não se trata de qualquer caso, não é mesmo?

Não pretendo desconsiderar a crueldade do acontecimento. De fato, a notícia de que uma criança de 5 anos foi asfixiada e arremessada do 6º andar e os principais suspeitos são o pai e a madrasta gera espanto e incompreensão. Entretanto, considerando que casos semelhantes acontecem cotidianamente, e que se trata de um fato particular, em que as famílias envolvidas são as únicas realmente prejudicadas com o ocorrido, lhe pergunto o por que de tanta comoção social. E as injustiças coletivas, em que o direito de toda uma população é violado? Onde estão, nestes momentos, a fúria e a disposição para ir às ruas gritar por justiça?

Tentemos nos recordar de outro caso repulsivo, com conseqüências e significações coletivas, em que uma das partes envolvidas representava o Estado. Falo do massacre do Complexo do Alemão ocorrido no ano passado. Quais eram mesmo os nomes dos mais de 20 mortos nesta chacina? O corpo da foto era de uma criança. Qual era mesmo o nome dela? Que idade tinha? Será o menino de 13 anos, um dos três adolescentes incluídos nos 19 mortos em um dia, coletivamente catalogados pela polícia e por uma parte da imprensa como “bandidos”?

Vale lembrar que a quase totalidade das mortes se tratou de execuções sumárias, e a ação foi planejada pela Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro, que contou com 1300 policiais militares e membros da Força Nacional de Segurança. Mas, me parece que o importante é que a ordem seja mantida, e apenas casos como “O de Isabela” ferem a esta normalidade, merecendo assim, tanta indignação e visibilidade.

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Terminal

Ontem eu perdi o dia
Hoje conheci o atraso
E me encontro parado, sentado
Em lugar algum
Com mil possibilidades e não encontro
Pois só queria uma, e não posso ter
Eu não te encontrei
E por não te achar, me encontro perdida
Em lugar algum
E se esse amor não fosse sublime
Eu sentiria vontade de gritar
Mas no momento só quero um abraço
Vamos, me envolva em seus laços
Me procure estarei sempre aqui
Em lugar algum
Enquanto não te encontro
E se pudesse sentir meu corpo neste momento
O sentiria pálido, gelado
Por que não me procurou?
Agora estou perdida no terminal
Sem saber para onde ir,
O que queria, não pude
E enquanto todos passam apressados
A procura de algo
Eu me encontro em lugar algum
Pois não há seu sorriso
A noite se pôs
Meus lábios se puseram
E eu não te encontrei

quinta-feira, 15 de maio de 2008

O Cabaré de Lorena

Lorena viu o olhar de Cássia embaixo dos óculos escuros
Procurando enxergar dentro de seu decote:
Fez que não viu;
Lorena ouviu Cássia soltar um suspiro de prazer
Quando disse para ela que gostava de ser dominada:
Fez que não ouviu;
Lorena sentiu o pé de Cássia por baixo da mesa levemente
Subir pela sua perna lhe dando arrepios:
Fez que não sentiu;
Lorena pensou em como seria o corpo nu de Cássia
Jogado sobre o seu enquanto elas se beijavam:
Fez que não pensou;
Acendeu o cigarro
E jogou a cabeça para trás:
Alegria e jovialidade sensuais,
Sensualidade e curiosidade safadas que se misturavam.

E junto daquela figura na mesa
Sentia como se passasse a noite num cabaré surrealista
Se tal coisa existisse.
Será que existe?
Será que lá mulheres beijam mulheres
Enquanto garçons nus as servem,
E será que da boca delas sai fumaça em formatos obscenos?
Os pratos possuem desenhos do Kama Sutra
E os guardanapos, frases do marquês de Sade?
E a musica...
Pornografia cantada por vedetes bêbadas.
E ali, na frente dela,
A rainha obscena,
A mulher da língua áspera como uma gata
Louca para leva-la ao submundo dos prazeres proibidos
Ou uma dama mal-vestida
Que quer seduzi-la para introduzi-la em seus jogos
Com seus parceiros?

Cássia não desiste da fumante compulsiva
Fala e fala da beleza dionisíaca das orgias
E Lorena se cala.
Ri e encara a morena jambo de pernas grossas
Convida com os olhos para um encontro secreto
E Lorena desvia o olhar.
Joga os braços até ela e toca seus cabelos,
Gesticula, dedos pornográficos para ela,
E Lorena não solta o cigarro.
Beija outra mulher e agarra-lhe o seio na frente dela
Para provocar e enciumar;
E Lorena apenas sonha.

A ultima taça de vinho,
Cássia oferece a Lorena.
Os últimos pensamentos de Lorena
Foram para Cássia e seu corpo de ninfa.
O ultimo beijo da noite
Acontece no apartamento de Cássia
Onde Lorena derrama vinho em seu peito
Convidando Cássia a toma-lo e saciar ambas;
Cássia deita-se entre as pernas de Lorena
E beija-lhe no seu mais íntimo;
Enquanto Lorena fecha os olhos
Lembrando do Cabaré em que conheceu sua nova paixão.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Feliz Dias das Mães!

Hoje é o dia das mães e me lembro daquela que me gerou e criou com desvelo e abnegação.

Para pagar os meus estudos, minha querida mãezinha teve que pagar muitos boquetes na praça 15. 15 centímetros. Trabalhadora incansável, a fama de mamãe espalhou-se pelo mundo como uma DST.

Mulher empreendadeira, minha amada genitora introduziu o cancro mole e a gonorréia no Brasil. Graças aos saudorosos carinhos de minha mãezinha, tornei-me um homem de bem, bem escroto, bem canalha e bem filho da puta. Mas nem tudo são flores.

Para desgosto de minha mãe, não consegui realizar o seu sonho dourado de ter filho, senador, deputado, juiz de futebol ou presidente da república.

Disciplinadora rigorosa, costumava me espancar violentamente e, em seguida me arremessa do alto do edifício do jornal A Noite. Foi aí que ingressei no mundo do crime e do jornalismo. Consegui um estágio no extinto periódico, onde eu posava de cadáver nas matérias de assassinatos.

Publicado em algum jornaleco.

terça-feira, 13 de maio de 2008

Na noite passada sonhei que alguém me amava...

Noite passada sonhei que alguém me amava, e que o amor significava algo além de uma palavra que necessita de muita poesia para existir. Sonhei que todos os meus sentimentos eram tangíveis e que não era preciso mais que olhares para ser compreendida. Sonhei que pacientemente ela estava ao meu lado, apenas a observar minha face úmida, vermelha de lágrimas incessantes que haviam caído por uma semana inteira. E ela, bela e honesta, olhava-me e amava-me. Neste sonho ela era tudo que meu coração precisava, ela era uma entidade certa e densa. Nela continha minha tristeza e alegria. Seu olhar profundo me coagia, mas também me aquietava. Ela era grande, muito maior que eu. Na noite que nos encontramos em sonho o mundo era noturno. Justo nós que temíamos a noite, não pelos medos que ela nos remete, mas pelas alegrias que apenas a noite contém. Então, sentadas na calçada nós estávamos mais unidas do que estaríamos em qualquer cama de motel. Eu chorava porque sabia que ela me amava, e ela, com uma paciência rara em um ser, ficou por horas parada ao meu lado. E eu chorava por uma semana inteira. Solucei ao seu lado, tão agressivo quanto afetuoso. Na noite passada eu sonhei que alguém me amava e me aterrorizei por isso. Quando olhei para o lado entendi que ela, que estava sentada a me olhar constantemente, vi que mesmo tendo os olhos azuis seus olhos possuíam o mesmo brilho de todas as outras que já estiveram ao meu lado, e que este brilho poderia me cegar se eu olhasse muito em sua direção.
Quando acordei entendi que ela estará sempre comigo, mesmo que nós nunca consigamos nos compreender tão simplesmente, mesmo que nossa relação seja sempre um mar turvo e complicado. Ela sempre existirá em minha vida, ela sempre me fará perceber que as amigas são uma entidade muito além de qualquer imaginação. Ela sempre aparecerá em sonhos para me dizer que essa palavra que humano alimenta, o amor, não passa de uma invenção, e que o único sentimento perfeito e, necessariamente incompreensível, é a amizade.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Maneira Profana de Amar

Esta acaba sendo minha estréia aqui, melhor então começar por aquilo que gosto mais: poesia. Nada mais justo do que homenagear quem me trouxe até aqui, quem me aproximou destas pessoas e que eu espero que me arraste até onde ela vá.

Você sorri como um anjo
E me incendeia feito o inferno.
E no cerne desta contradição, suas palavras
E beijos;
Trazendo à superfície de meu corpo
Sensações tão contrastantes entre si.
Quando caí nos teus braços,
Pus meu coração na linha de fogo
E tu passaste a escrever em meu peito
Mais um pequeno capítulo desta velha
Comédia humana,
Tragédia de desenganos e incomunicabilidade,
Romance de corpos e provas de amor;
Ah, coração sugestionável!
Não quero mais nada,
Nem certeza nem vontade,
Nem mais um ano de vida nem recordações:Só teus lábios ardentes me trazem o sabor da verdade.

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Minha Brasília

Quatro dias, noventa e seis horas e uma eternidade para lembrar duma Brasília tão seca, fria e corrupta, mas possuidora de uma sagacidade que me faz escrever.

Foram tantos que exalaram toda a fragrância de uma loucura juvenil estancada nos corpos, nos olhares, nos desejos que desconhecia a existência do outro.

Um encontro para lá de piriquitante!

Foi no quilombo, na sala, no quarto, durante noventa e duas horas de um frenético sopro do prazer crítico, irônico, alcoólatra, dopado.

Brasília deixa em nossa memória um pedaço de toda mistura étnica cheia de vícios e de sonhos.

Dessa lembrança guardo o choro de desespero em não ir que pré-sentia o quanto seria inédito estar lá.

Sobre este texto nostálgico fica a lembrança de uma conquista imaterial, preenchida com o novo, discutida com o outro e encerrada a cada noite embriagada nos braços de quem acabava de amar.

Mas é hora de fazer o check-in, chegou à hora de volta.

Volta para o cotidiano pobre, sem sonho, sem ideologias que guarda na alma o desejo de viver o próximo majestoso delírio humano.

sábado, 3 de maio de 2008

Drummond

Deixo hoje um dos poemas de Drummond que mais gosto.

Este poema apareceu inicialmente,
com o título "Verdade", no livro Corpo, de 1984, um ano antes da publicação de Contos Plausíveis, de onde foi extraída esta versão.



A Verdade Dividida
A porta da verdade estava aberta
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.

Assim não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava
só conseguia o perfil de meia verdade.
E sua segunda metade
voltava igualmente com meio perfil.
E os meios perfis não coincidiam.

Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta.
Chegaram ao lugar luminoso
onde a verdade esplendia os seus fogos.
Era dividida em duas metades
diferentes uma da outra.

Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
Nenhuma das duas era perfeitamente bela.
E era preciso optar. Cada um optou
conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia.





sexta-feira, 2 de maio de 2008

Vermelho como o Céu

Aposto que a primeira coisa que veio a sua cabaça foi: “Mas o céu é azul”. Nem sempre, eu responderia, hoje, por exemplo, o céu está cinza, a noite ele fica preto-azulado ou azul-marinho, com gotículas brancas, azul, amarelas e alaranjadas, se prestar bastante atenção verá uma lua. E no fim de tarde, nas grandes cidades, pode ficar cinza, uma cor um tanto indefinida, nem dia nem noite. Mas se tiver o privilégio de observar o crepúsculo em outro lugar perceberá que ele lilás, rosa, laranja, amarelo e porque não, vermelho!
Se eu te perguntasse qual o sentido que você tem mais aguçado, olfato? paladar? audição? Acredito que não responderia visão, talvez porque estamos tão habituados a ver que esquecemos que esse sentido é tão importante em nosso dia a dia. Você tem olhos, certo? Se tiver, feche-os. Vejo que não consegue ler o que escrevo. Mas feche os olhos! O que você sente? Na frente de minha casa tem um pé de manga carregado de passarinhos, eu consigo ouvi-los piar, você ouve? Se estiver num lugar tranqüilo aposto que pode ouvir o barulho do seu computador, mas se tiver numa lan house ouvirá outras pessoas batendo na tecla, se estiver em casa com mais alguém aposto que tem uma televisão ligada, ou alguém conversando no telefone. E a cadeira em que está sentado, é confortável? Está ventando onde você está? ou tem ar condicionado? Faz frio ou calor?
Bem, certamente não prestamos muita atenção nessas coisas em nosso cotidiano! Se tiver olhos e puder enxergar (acredito que assim, afinal está lendo isso agora) então minha dica seria ver o filme “Vermelho como o céu” (Rosso Come Il Cielo, Itália, 2006) que está em cartaz no Metrópoles essa semana e a próxima, mas tem que conferir o horário no jornal.
Talvez assim possamos exercitar os outros sentidos de nosso corpo que temos esquecido por esses dias. Vamos feche os olhos e me diga o que pode sentir. Conseguiria se locomover por sua casa? prestaria mais atenção no barulho dos poucos passarinhos espalhados pelas árvores das grandes cidades? Você se daria conta de seu andar, de seus pés aprisionados em seu sapato? Vamos tire os sapatos, o chão é frio ou quente, duro ou macio? A brisa que corre é úmida ou seca? Mas eu tenho certeza que não fechou os olhos! Cerre -os agora!

domingo, 27 de abril de 2008

RECOMEÇO

Recomeçar é sempre um grande passo

Porque é difícil esquecer o passado

Os momentos bons que foram vividos

É difícil se desapegar das coisas, das pessoas

Devido a essa nostalgias esquecemos de viver o presente

E aproveitar os momentos que estão sendo vividos

O passado parece sempre melhor que o presente

O que torna o recomeço difícil

O eu é esquecido o outro parece sempre melhor e mais importante

A vida parece sem graça, uma desgraça

Onde nada é bom o suficiente,nada é melhor do que o que se foi

Sendo que o que se foi, realmente deveria ter ido

Mas parece entranhar-se na sua alma, no seu corpo

O presente esquecido se torna enfadonho

E os momentos bons que a vida lhe oferece parecem inoportunos

E quando o passado já não se fizer mais tão presente

Finalmente poderei dizer esse é o meu recomeço

Autoria própria.

sábado, 26 de abril de 2008

Abram Alas pro Morro

Engraçado como alguns desconfortos são prazerosos.
A subida da ladeira me fazia ofegar e ainda assim a sensação era de prazer. De todos os morros que já subi, este foi o primeiro em que fiquei a beira mar.
O café a que nos dirigíamos era francês.
Instantes após a chegada visualizamos o apagar das luzes do convento abençoando a libertação dos prazeres profanos.
Ainda não estava embriagada, mas era como se estivesse. Meu corpo se movia com a dança sem qualquer esforço nem acanho. A música era ótima, o espaço agradável e todas as sensações estavam à flor da pele.
Sabia que não era bem-vinda por todos. Alguns olhares me mostravam isso a todo o momento. Ainda assim, me sentia em casa. Tudo ali, até mesmo estes olhares, me interessava. Atrás do balcão se encontrava a francesa, que por se tratar de um ser andrógino, atraía até mesmo mulheres heterossexuais. Junto dela, estava um japonês-índio. Nunca havia conhecido pessoas com essa miscigenação, e confesso que se me contassem, duvidaria da possibilidade de se tratar de uma pessoa interessante.
O elemento negro se encontrava em quase tudo e todos. O gingado, a música, os sorrisos, a pele, os dentes. As horas passavam e o café, moído na hora, nos mantinha acordados e vivos.
Chegou um momento em que dançava e cantava olhando dentro de olhos tão queridos, de amigos tão amados, e tinha a absoluta certeza de que a minha sensação era comum àquelas pessoas. O lugar foi se esvaziando, o domingo clareando. Era hora de descer a ladeira, pois a missa dominical estava prestes a começar.


O Morro Não Tem Vez (Tom Jobim) com Afonso Abreu Trio - Afonso Abreu ao contrabaixo, Pedro Alcântara ao piano, Marco Antônio Grijó à bateria e Melão à percussão.

sexta-feira, 25 de abril de 2008

Café Russo: a crônica.

Nesta manhã cheia de possibilidades me afogo e embriago no copo de café para me manter acordado, precisava levantar minhas pálpebras, dilatar minha pupila e conectar meus neurônios. Já se foram sete copos, sem açúcar. Naquela semana, para piorar minha saga neste mundo torpe, havia perdido meus óculos, o segundo em dois anos, não me pergunte onde, se soubesse estaria vestida de meus olhos, mas não sei, há algo no meio do caminho que não recordo.

A preguiça e a falta de sentido ocular me embriagavam mais. Não sabia bem o que tinha acontecido direito por aqueles dias, parte pelo álcool, parte pela miopia, parte pela preguiça. Mas justo hoje, naquele momento, precisava mover minhas pernas, meus braços, mexer meus quadris. Precisava mover-me daquela cadeira. e sabia que só conseguiria tal feito com muito café na veia para impulsionar meu corpo.

Primeiro senti os dedos do pé. Fiquei feliz em saber que eles ainda estavam por ali. Num susto, já me dei conta de minhas pernas, minhas nádegas pregadas naquela cadeira, meus braços escorados sobre a mesa, consegui ouvir um barulho vindo de meu peito, estava viva, percebi minhas mãos coladas na xícara de café, caminhavam até minha boca e depois voltavam a se apoiar na mesa. e como se tivesse voltado ao meu corpo depois de aprecia-lo abaixo de meus olhos, enxerguei, embora embaçado, a geladeira em minha frente e minha cachorra a me espiar com aqueles olhos molhados e focinho albino, sempre pedindo carinho.

Pela primeira vez notei que tudo era tão branco, o piso branco, o azulejo branco, o fogão branco, a pia branca, o armário branco, a mesa branca, a dudi branca, a toalha de mesa branca, a batedeira branca, a xícara branca, o banquinho branco, a mesa branca. Eu pálida e o café preto, bem preto, amargo, a estalar minha goela, quente, e esquentava meus dedos frios, aquecia meus ânimos e tornava minha íris escura.

Num impulso levantei-me, aquele era o momento, eu pude sentir. Levantei-me num golpe só, sem medo. Confesso que minhas pernas tremeram, afinal não há café neste mundo que me faça recuperar toda a energia que perdi neste mês, mas logo firmei meu corpo ao chão.

No transcol lotado, percebi o porquê de minha recusa de sair de casa. Eu baixinha, ainda inexperiente, me espremendo entre braços, bundas e peitos, me via esticada tentando alcançar a alça no teto. Um braço de cada lado, e meus pés se punham na ponta dos dedos, justo eu que nunca tive vocação pra bailarina. Na curva percebi o valor de um ônibus lotado, pois os tórax ali dispostos e estirados não me deixaram cair e espatifar no chão com a delicadeza de uma jaca. E eu ali com os braços para o alto e as pernas tencionadas me via num impasse de ironia invertida: ressuscitada pelo café e crucificada num navio negreiro pós-moderno.

Trabalho, café, trabalho, café, trabalho, trabalho, café, trabalho, café, trabalho, café, trabalho, café, trabalho, café, trabalho, café, trabalho, trabalho, café, trabalho, café, trabalho, café, trabalho, trabalho, café, café, trabalho, café, trabalho, café, trabalho, café, trabalho, café, trabalho, trabalho, café, café, trabalho, café, trabalho, café, trabalho, café, trabalho, café, trabalho, trabalho, café, trabalho, café, café, café, café, ônibus lotado.

No final da noite, frenética, e por razões lógicas, insônia. Já até encontrei uma categoria que inventei para me enquadrar em alguma coisa, afinal neste mundo não dá pra viver a deriva, temos que nos enquadrar em alguma categoria. A minha: esquisofrenética. Esquiso por parte da insônia e frenética por conta do café.

E mamãe insistia em dizer:
-Quem tomou todo o café?

E eu respondia com os olhos arregalados:
- Você é claro!

quinta-feira, 24 de abril de 2008

O Frio e seus Encantos

Viver é diluir-se, Leila sabia muito bem disso. Sabia que é preciso se dissolver no inesperado, ela sabia que só no desconhecido poderia encontrar, surpreendida, o que deseja. Ela que não sabe o que deseja, só por aquilo que não anseia corre o risco de se encontrar. Ela é como alguém que na procura de vida só procura pessoas. Seus prazeres são compartilhados, sua felicidade só pode ser se for com mais alguém.

Depois de seu rituoso preparo, olhou-se no espelho e deixou-se seduzir por completo pelo frio e saiu de sua aquecida casa com o tom mais vivo de vermelho que possuía nos lábios. Caminhando cambaleante no salto - já havia esquecido como era caminhar em cima daqueles finos saltos - ela foi ao encontro do rapaz que lhe chamara para beber vinho. Conhecera-lhe poucos dias antes e não entendia direito ainda se estava saindo de casa pelo convite do rapaz ou pela sedenta vontade de sentar-se ao sereno da noite na calçada de um bar, sonhando estar em uma calçada de Paris. As calçadas sim eram algo que seguramente lhe agradavam.

O ônibus em que Leila estava parou para recolher passageiros no ponto que se localizava em frente a uma loja de acessórios. Leila prestou atenção para a ostensiva tela que ficava no lugar de maior destaque da loja. Era a imagem de uma mulher pintada e adornada com pomposos acessórios, idênticos aos que estavam expostos na vitrine, que cobria uma parede inteira. Olhando para a pintura Leila reparou que no fundo da loja, sentada atrás de uma solitária mesa, estava a mesma mulher, tão menor que a da pintura pendurada na parede de destaque, com um altivo e ao mesmo tempo perdido olhar. Dispôs-se então, como que para passar o tempo, a tentar entender o que uma mulher que expõe tão soberbamente sua própria pintura estaria sentindo. Seria a amargura que ao brotar em seu intimo a estava envelhecendo? O destino era personagem constante na mente de Leila, ela não cansava de pensar e imaginar como a sucessão dos fatos pode ser surpreendente. Imaginar os pensamentos das pessoas lhe fazia bem, assim ela vivia.

(continua...)

sexta-feira, 18 de abril de 2008

Apresentação

Os dias da semana são sete, sete é o número da sorte, ou do azar e somos sete amigos! E criamos o blog para que cada um de nós poste em um dia da semana, assim as atualizações serão diárias, se ninguém chapar todas no dia anterior e esquecer que é a sua vez de postar, coisa comum por aqui. Afinal a cafeína é para nos manter acordado e a vodca embriagados, por isso Café Russo!

Café Russo é um projeto de um de nossos integrantes de montar um bar café real em que se possa discutir literatura, filmes, arte em geral, política, sexo, sexualidade, bizarrisses, cotidiano, etc. o que vier é lucro! Enquanto o projeto real não sai da imaginação resolvemos cria-lo no mundo virtual mesmo (gasta menos dinheiro, rs)

Bem vindos e
Embriagai-vos, seja de café, de álcool, de literatura, política, sexo, filme...