Engraçado como alguns desconfortos são prazerosos.
A subida da ladeira me fazia ofegar e ainda assim a sensação era de prazer. De todos os morros que já subi, este foi o primeiro em que fiquei a beira mar.
O café a que nos dirigíamos era francês.
Instantes após a chegada visualizamos o apagar das luzes do convento abençoando a libertação dos prazeres profanos.
Ainda não estava embriagada, mas era como se estivesse. Meu corpo se movia com a dança sem qualquer esforço nem acanho. A música era ótima, o espaço agradável e todas as sensações estavam à flor da pele.
Sabia que não era bem-vinda por todos. Alguns olhares me mostravam isso a todo o momento. Ainda assim, me sentia em casa. Tudo ali, até mesmo estes olhares, me interessava. Atrás do balcão se encontrava a francesa, que por se tratar de um ser andrógino, atraía até mesmo mulheres heterossexuais. Junto dela, estava um japonês-índio. Nunca havia conhecido pessoas com essa miscigenação, e confesso que se me contassem, duvidaria da possibilidade de se tratar de uma pessoa interessante.
O elemento negro se encontrava em quase tudo e todos. O gingado, a música, os sorrisos, a pele, os dentes. As horas passavam e o café, moído na hora, nos mantinha acordados e vivos.
Chegou um momento em que dançava e cantava olhando dentro de olhos tão queridos, de amigos tão amados, e tinha a absoluta certeza de que a minha sensação era comum àquelas pessoas. O lugar foi se esvaziando, o domingo clareando. Era hora de descer a ladeira, pois a missa dominical estava prestes a começar.
O Morro Não Tem Vez (Tom Jobim) com Afonso Abreu Trio - Afonso Abreu ao contrabaixo, Pedro Alcântara ao piano, Marco Antônio Grijó à bateria e Melão à percussão.
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